sexta-feira, 14 de março de 2014

O bispo de Roma do fim do mundo

“O carnaval acabou, não vou usar isso!” (Francisco)

O fim dos tempos e principalmente da vida humana sempre foi um problema ou questão que nos deparamos e procuramos compreender e/ou adiar. Já escutamos tantas vezes profecias do fim do mundo, que ao ouvirmos um novo anúncio de tais datas não nos surpreendemos ou até mesmo fazemos chacota de suas hipóteses, mesmo que nos preocupemos com tais questões. Porém, no dia 13 de março de 2013, ouvimos depois de um caloroso “boa noite” (Buena Sera!) que um senhor havia vindo do “fim do mundo” para ser o bispo de uma das primeiras – senão a primeira – diocese cristã da humanidade.
            Tenho que concordar que o termo “fim do mundo” usado por este senhor, cujo nome passou a ser Francisco, foi num sentido de lugar e não de momento temporal. Contudo, quero aqui refletir também sobre o significado temporal que sua ação episcopal trouxe-nos neste primeiro ano de pastoreio petrino[1].
            Ao saudar ao público presente com o “boa noite”, Francisco mostrou ao mundo que ele era um homem que estava na história humana e que dialogava da mesma forma como todos. Isto é, Francisco é uma lembrança do Jesus que não chegava com solenidades e/ou rituais litúrgicos, mas antes com uma abertura para o diálogo – normalmente, quando nos aproximamos de alguém para o diálogo fazemos uma saudação: “bom dia!”, “como vai?”, “E aí? Tudo bem”. Com estas palavras e todas as outras que vem falando ao longo deste ano, o atual bispo de Roma mostrou-nos o estilo cristão que precisamos ter ao levar o anúncio de Jesus que é o diálogo que se abre para outro e não impõe (de forma até mesmo violenta) discursos: “Queria bater em cada porta, dizer um ‘bom dia’, pedir um copo de água, beber um cafezinho, e não um copo de cachaça” (Francisco na favela de Varginha, RJ).
            Além disso, ser o sucessor de Pedro do fim do mundo é manifestar que o início chegou a partir do fim. Francisco vem do fim do mundo em dois sentidos, conforme lembrei acima: Num primeiro, o temporal, Francisco vem para nos lembrar que estamos em uma mudança de época e que a Igreja precisa perceber e viver esse tempo de fim que é capaz de iniciar: “A Igreja sempre deve ser reformada...” (Homilia dia 09/11/13, na Casa Santa Marta); No segundo sentido, o físico, Francisco vem do continente onde mais se encontra fieis católicos no mundo e também traz a característica de uma Igreja periférica e bem diferente do estilo europeu, conforme nos lembra Leonardo Boff:

Ele não vestiu o figurino clássico do “papa monarca” com o primado jurídico absoluto e com a supremacia doutrinal e pastoral. Ele se entende com bispo de Roma e quer presidir na caridade. É importante observar que esse papa cresceu dentro do caldo cultural e eclesial da Igreja latino-americana, cujo rosto é muito diferente da Igreja da velha cristandade europeia. É uma Igreja viva, com comunidades de base, com pastorais sociais fortes, com figuras de bispos proféticos e com mártires da perseguição das ditaduras militares.[2]

Posso salientar ainda que Francisco é o estar na história humana e assumi-la numa postura mundana, que vive com intensidade as coisas humanas. Francisco tem nos mostrado que ele é um humano como todos os outros, sem escapar dos erros, dos trabalhos, das atividades etc. Lembro-me aqui do bispo de Roma que ousa assumir que já cometeu furtos, que já chegou a utilizar drogas e que, mesmo tendo isto em sua história, consegue ser uma pessoa boa e que anuncia um Reino de Deus, assim como Jesus o fez. O sucessor de Pedro deixa claro que todos, sem exceções na e da sua história, são anunciadores do Reino de Deus. Também é um bispo que acolhe a todos, sem medo de se aproximar de forma totalmente física das multidões e das pessoas. Aproxima-se tanto no contato humano-físico-espiritual dos que estão marginalizados (mulheres, jovens, drogados, pobres, idosos, gays, não-católicos e não cristãos, etc.), quanto das multidões que querem experimentar o contato de afeto e de alegria, assim como fez o Nazareno: “‘Mestre, a multidão te comprime e te esmaga’ Jesus insistiu: ‘alguém me tocou; eu senti uma força que saía de mim’” (Lc 8,45).
            Ainda tenho que salientar também que o novo ocupante da cátedra de Roma é uma revolução na Igreja. Só que ele é um revolucionário que deseja mudar antes de tudo a si mesmo, trazendo, antes de uma reforma na Cúria, uma reforma no Papado[3]. Ele já sabe que deve ter cuidado com a intitulada “lepra do papado” e também que deve ser mais aberto às mudanças que darão oportunidade a todos de participarem da Igreja de forma decisiva e não simplesmente passiva.
            Sendo assim e sabendo que não disse tudo que já se fez e ainda vai ser feito, só nos resta dizer e também praticar o moderníssimo #TAMOJUNTO Francisco, pois temos consciência que o cristianismo precisa de pessoas disponíveis e amantes de Jesus e de seu projeto do Reino de Deus. Portanto, após este bom período da transfiguração do papado e escuta da Palavra, é hora de deixar que nossos ouvidos e olhos vejam e ouçam de Jesus, assim como no monte Tabor: “Levantai-vos e não tenhais medo!” (Mt 17, 6b).

JACKSON DE SOUSA BRAGA
#SENDOJUNTO_NA_FÉ
Viçosa, 15 de março de 2014.




[1] Saliento que não estou aqui querendo compará-lo com algum de seus antecessores ( por mais que João Paulo I tenha características muito parecida) ou torná-lo superior, mas antes desejo mostrar que ele é uma diferença bela e importante que considero histórica e única.